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O sistema de solidariedade na política migratória da União Europeia

Foto do escritor: Kathelly MenezesKathelly Menezes

Nas últimas décadas, a União Europeia (UE) tem enfrentado um aumento significativo nos fluxos migratórios, especialmente em direção a países fronteiriços, como Espanha, Itália e Grécia, que recebem um número elevado de migrantes e refugiados em sua chegada ao continente. Esse fenômeno exigiu a formulação de políticas que permitam uma gestão compartilhada e equitativa entre os Estados-membros da UE (European Commission, 2020).

A migração é um fenômeno complexo e multifacetado, com raízes profundas na história da humanidade. Estudos arqueológicos revelam deslocamentos humanos realizados em resposta a condições ambientais adversas e em busca de melhores oportunidades. Assim, ao longo do tempo, a migração contribuiu para a formação de sociedades e para o intercâmbio cultural e econômico. No contexto contemporâneo, esses movimentos variam entre nacionais e internacionais, temporários ou permanentes, regulares ou irregulares, e podem ser voluntários ou forçados, impulsionados por fatores sociais, econômicos, políticos e ambientais (UNHCR, 2023).

Os conflitos e crises humanitárias frequentemente resultam em deslocamentos forçados de refugiados, que, somados à busca por melhores condições de vida e oportunidades econômicas, desafiam as políticas de migração da União Europeia (UE). Diante dessa complexidade, a UE tem trabalhado para estabelecer uma abordagem coordenada para a gestão migratória, especialmente em relação aos Estados-membros que atuam como portas de entrada, conforme delineado em seus tratados e políticas (European Council, 2022).

Hoje, o movimento migratório pode ocorrer tanto entre países quanto dentro de fronteiras nacionais, e pode ser temporário ou permanente, regular ou irregular, voluntário ou forçado. As motivações para migrar são complexas e podem ser agrupadas em três principais categorias: refugiados, trabalhadores temporários e migrantes permanentes. Essas motivações derivam de fatores sociais e políticos, econômicos e demográficos, além de causas ambientais.

Os fatores sociais e políticos incluem questões de etnia, religião, políticas governamentais e situações de conflito ou perseguição. Para os refugiados, esses fatores são fundamentais para o reconhecimento do status de proteção. Fatores econômicos e demográficos, por sua vez, abrangem a busca por melhores oportunidades de trabalho, salários mais altos, estabilidade econômica e acesso a serviços essenciais. Já os fatores ambientais, como desastres naturais e mudanças climáticas, têm historicamente contribuído para o deslocamento de populações.

Para mitigar a pressão sobre esses países, a UE introduziu o conceito de "solidariedade obrigatória", que consiste em um sistema de responsabilidade compartilhada entre os Estados-membros. Esse sistema prevê que cada Estado-membro receba uma parcela de migrantes e refugiados ou, alternativamente, contribua financeiramente para o acolhimento em países mais afetados. Esse mecanismo, previsto para entrar em vigor em 2026, visa garantir uma divisão mais equitativa das responsabilidades, respeitando ao mesmo tempo a diversidade de contextos e capacidades dos diferentes países.


Impactos e Questões Associadas ao Sistema de Solidariedade

A implementação do sistema de solidariedade obrigatória representa um esforço para equilibrar as responsabilidades entre os Estados-membros e responder ao desafio migratório de maneira colaborativa. No entanto, é importante reconhecer que a redistribuição de migrantes entre os países da UE envolve questões complexas, inclusive no que diz respeito ao respeito aos direitos humanos e ao compromisso com as convenções internacionais.

Organizações de direitos humanos, como a Human Rights Watch e a Anistia Internacional, alertam para a importância de garantir que todos os Estados-membros observem os direitos fundamentais dos migrantes e refugiados, conforme previsto na Convenção de Genebra de 1951 e em outros tratados internacionais. Em alguns contextos, políticas de controle rigoroso e detenção podem surgir como alternativas para gerenciar esses fluxos, o que levanta discussões sobre o equilíbrio entre segurança e a proteção dos direitos.

Além disso, a redistribuição de responsabilidades pode acentuar divergências entre Estados-membros com diferentes abordagens para a migração. Países com políticas mais restritivas, como a Hungria e a Polônia, manifestaram reservas quanto à adoção de uma abordagem obrigatória de acolhimento, preferindo contribuir financeiramente ao invés de aceitar migrantes. Isso levanta questões sobre a coesão do bloco e os possíveis impactos de um sistema que se baseia tanto na contribuição financeira quanto no acolhimento direto (European Council, 2022).


Compatibilidade com Normas Internacionais e o Papel da UE

A UE, como signatária de importantes tratados e convenções de direitos humanos, possui um compromisso explícito com o respeito aos direitos e à dignidade de migrantes e refugiados. A Convenção de Genebra de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados, por exemplo, estabelece normas para o tratamento de refugiados e define o princípio de non-refoulement, que proíbe a devolução de pessoas a territórios onde suas vidas possam estar em risco. Assim, qualquer sistema de acolhimento e redistribuição dentro da UE necessita de acompanhamento e avaliação regulares para assegurar o alinhamento com esses compromissos.

Além disso, políticas de solidariedade precisam equilibrar o respeito às obrigações internacionais com as capacidades e políticas nacionais de cada Estado-membro. O sistema de solidariedade da UE busca justamente esse equilíbrio, ao mesmo tempo em que procura fortalecer uma abordagem comum e integrada para lidar com os desafios migratórios.


Possíveis Alternativas para uma Política Migratória Inclusiva e Sustentável

Diante dos desafios e das complexidades associadas ao sistema de solidariedade, diversas alternativas têm sido sugeridas para aprimorar a gestão migratória dentro da UE. Uma abordagem possível seria a promoção de políticas que favoreçam a integração social e reinserção econômica dos migrantes, incentivando programas de capacitação, inclusão no mercado de trabalho e a facilitação para a revalidação de diplomas. Esse modelo poderia permitir que os migrantes contribuem para o desenvolvimento das comunidades receptoras, promovendo uma visão mais abrangente e positiva da migração.

Além disso, a UE poderia intensificar o apoio técnico e financeiro aos Estados-membros mais afetados pelos fluxos migratórios, fornecendo assistência financeira e técnica para estabelecer centros de recepção humanitária, incluindo acesso a serviços de saúde, educação e assistência social. Isso permitiria o recebimento e integração dos migrantes, em vez de apenas transferir as pressões para outras regiões.

Por fim, uma abordagem de longo prazo deve incluir um compromisso renovado com os direitos humanos, reafirmando o papel da UE como um ator comprometido com a proteção e a dignidade de migrantes e refugiados. O fortalecimento de um sistema que equilibre a solidariedade e a responsabilidade compartilhada, ancorado no respeito aos tratados internacionais, representa um passo importante para consolidar a coesão e a eficácia das políticas migratórias no bloco.


Referências

European Commission. (2020). Migration and Asylum

https://home-affairs.ec.europa.eu/policies/migration-and-asylum/common-european-asylum-system_en#:~:text=In%202020%2C%20the%20European%20Commission,strengthened%20partnerships%20with%20third%20countries.

European Council. (2022). Solidarity in Action: Addressing Migration Challenges

https://www.consilium.europa.eu/en/policies/coronavirus-pandemic/european-solidarity-in-action/

Human Rights Watch. (2023). Refugees and Migrants’ Rights

https://www.hrw.org/tag/europe-refugees-migrants-rights#:~:text=Just%20over%20100%2C000%20people%20arrived,people%20unlawfully%20at%20EU%20borders.

UNHCR. (2023). Global Trends: Forced Displacement

 
 

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